segunda-feira, 1 de outubro de 2007

As noites num hospital duram mais

Na Visão da semana passada (27 de Setembro) foi publicada uma grande entrevista com o António Lobo Antunes a propósito do seu novo livro - «O Meu Nome é Legião» (Dom Quixote). Nesta entrevista, o escritor conta, pela primeira vez com tanto pormenor, como foi descobrir, enfrentar e tratar um cancro que «lhe bateu à porta» no início deste ano.
São muitas as declarações que me chamaram a atenção, mas não pude deixar de memorizar o seguinte: «Não há nada de mais horrível do que uma noite passada num hospital. São noites infinitas. E é aí que aparece o desamparo.» Sim, António, eu que, também há pouco tempo, tive de passar umas noites no hospital, depois de uma cirurgia, corroboro estas palavras. Nunca na minha vida passei por algo tão horrível, tão doloroso, tão penoso.
Não se consegue comer, dormir e até a respiração parece querer falhar. É impossível dormir, é impossível comer, é impossível ter pansamentos animadores, é quase impossível respirar no seio de tanto sofrimento - o nosso, mas, acima de tudo, o dos outros.
As náuseas e os vómitos constantes provocados pela anestesia; os fortes analgésicos que nos assolam com tonturas e quase nos deixam sem forças; as veias todas picadas de tanto se procurar o ponto certo para o soro e todos os medicamentos; os suspiros e gritos sofridos dos que estão no nosso quarto, nos outros quartos e em todo o piso; as enfermeiras que não param a noite toda de ziguezaguear pelo corredor; as luzes que nunca se apagam... Enfim, claro que, com isto tudo, foi normal sofrer, pela primeira e única vez na vida, de ataques de pânico. A aflição era tal que, à segunda noite, tive de pedir a uma enfermeira que me desse «qualquer droga que me fizesse dormir».
Felizmente, tratou-se de uma intervenção simples e de curto internamento, mas estes foram momentos que registei como os piores que vivi até hoje... Mas, como costumo dizer, tudo o que nos acontece na vida tem um sentido positivo e não tenho qualquer dúvida de que esta experiência me enriqueceu muito e me fez ganhar mais força para enfrentar a adversidade e o sofrimento.
Nada de tristezas, eu não estou triste, só me deu vontade de escrever e compartilhar isto porque esta entrevista do António Lobo Antunes, que acabo de ler, tocou-me profundamente e fez-me recordar esses momentos. Principalmente quando ele diz: «Foi muito difícil. Enfim, muito difícil é exagero. Porque, ao lado, vi pessoas que estavam muito piores do que eu. Pessoas sem esperança, à espera da morte. As minhas hipóteses eram grandes e, por isso, às vezes, sinto-me culpado.»
Culpado? Sim, eu entendo, a culpa de não poder dividir a vida que ainda temos com essas pessoas.

1 comentário:

Anónimo disse...

Uma escrita fantástica... Parabéns!